terça-feira, 28 de outubro de 2008

Desfaçatez

Finjo que não ouço
Finjo que não sei
Finjo que não leio
Finjo que não quero
Finjo que perdôo
Finjo que me calo
Finjo que não clamo
Finjo mergulhar...
No mundo onde os pés pisam em brasas
Onde a minha dor não é a sua
Onde o seu problema não é meu
Onde a paciência esgotou
Onde prevalece o tráfico de ilusões
A dor da impossibilidade de escolha
O tédio do fracasso
O cansaço do mesmo
A convivência aborrecida
A obrigação no lugar do prazer
A inconstância dos seres,
Finjo, apenas finjo.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Do incerto

Busquei alguma constância na inconstância dos meus dias
Raciocinei com meus sentimentos, briguei com todos eles
Calculei o que faria com meus dias
Exigi respostas
Imaginei como deveria acontecer
Caí, quando precisava estar em pé
Me enganei, quando achei que me conhecia
Levantei, quando achei que não reunia forças
Reconheci
Meus erros, pela fraqueza de ser, humano
Pensei, repensei, refleti
Concluí
Que cansei de pensar,
De esperar,
De idealizar,
De me consumir,
De chorar,
De mentir pra mim
Decidi
Sonhar,
Esperar,
Esquecer o calendário,
O relógio,
A cobrança,
A mágoa,
A ferida.
Para não me reconhecer mais no espelho com o rancor
Dos que estão perdidos
Na incerteza
Do dia seguinte que nunca foi meu.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Do céu vermelho

Só Deus sabe o quanto me faz bem uma sessão de cinema. E pode ser besteirol, uma comédia, um drama carregado... o interessante é despertar, sei lá, sair dessa dimensão próxima e partir para um novo cenário, novos personagens, roteiros desconhecidos, imagens, pensamentos tantos. Porque nem só de Amélie vive essa quase cinéfila que vos fala. A intenção aqui não é a de construir uma crítica de cinema (isso eu deixo para meu amigo Rafa em seu blog Moviola Digital). Apesar de adorar mergulhar no mundo da crítica, resolvi construir uma pequena poesia, um esboço do meu olhar para o filme Vermelho Como o Céu ( Rosso Como Il Cielo, Itália, 2006). As críticas deixemos para um bom bate papo, que pode ser em um bar, em um encontro ao acaso, via msn ou como acharem melhor. Aos que não assistiram, fica a indicação.





Uma vez no escuro passei a enxergar com o tato

Descobri a fundo, a cor que pode ser o mundo

Como é o azul, o verde, o amarelo?

Qual a cor que escolheste pra ser sua?

O valor de cada som

A chuva que é música

O sol que queima a pele

Posso sentir

A brisa silenciosa em meu rosto

Seus dedos em minha face

O torpor que me provoca sua doce declaração de amor

No escuro, serão dois cegos?

Engana-se quem pensa que não existe luz

Nos olhos enevoados dos que vêem mais do que todos nós.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Surpreendido



O celular que toca na madrugada vazia

A lua cheia no céu, linda

O olhar embriagado de tantos sentimentos

A rosa vermelha

O tempo, curioso tempo

A imposição dos costumes

As cartas de amor

O segredo

A espera

Um ponto de interrogação

Os risos, milhares deles

O pedido de desculpas

O inesperado, calado, desperto, desejado

O beijo de chegada

O adeus da despedida

A comemoração

Os amigos

A vontade

O mistério

O incerto

A sorte

Os anjos

A música

Os capítulos inacabados de um autor sábio

Que acorda, me olha, te olha

Se inspira

E misteriosamente, surpreende...

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Das coisas simples


E também das coisas fúteis,por que não? Hoje quero falar sobre as pequenas coisas que dão sentido maior à nossas vidas. Sobre aquele dia em que você não deu nada quando ele começou e resolveu passar na casa de um amigo pra bater um papo. E saiu de lá renovado. Sobre uma boa ação do dia, como dar o endereço de uma rua a alguém que estava perdido. Sobre retribuir um sorriso a um desconhecido. Sobre cantar sua música favorita debaixo do chuveiro enquanto toma banho. Ou sobre aquela mensagem que chega inesperada em seu celular e te surpreende... Eu conversava com um amigo que está distante geograficamente, fisicamente, mas não sentimentalmente falando, rsrs, e me veio a idéia deste post quando falávamos exatamente dessas coisas simples. De como elas interferem na nossa felicidade, ou nos proporciona momentos de alegria. Alguns até taxariam esses "pequenos prazeres" cotidianos de coisas inúteis ou fúteis, mas quem sabe a diferença de coisas simples na vida da gente sabe muito bem do que estou falando. E eu incluiria até a tecnologia nessas coisas simples. Nossa, o msn é a minha ferramenta mais que especial para bater esse papo renovador com os amigos. Ou não, podemos conversar sobre coisas inúteis e racharmos de rir do mesmo jeito, por que não? Detalhes que fazem toda a diferença.

É por isso que declaro sempre o meu amor ao filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, do diretor Jean-Pierre Jeunet, porque ele fala exatamente desses pequenos prazeres. De como não somos estranhos por querer realizá-los, simplesmente, porque gostamos. São poucos os que admitem os seus pequenos prazeres, ou pecadinhos, por que não denominá-los assim?

Proponho a vocês um exercício aqui. Vamos citar coisas simples que nos fazem bem? Eu começo: gosto de cantar bem alto em casa com o som mais alto ainda quando estou sozinha. Gosto também de andar em um ônibus que dá mil voltas até chegar em minha casa com o mp4 no ouvido, ouvindo as canções, pensando em mil coisas e em nada, e olhando a paisagem. Gosto de deitar no chão do quintal daqui de casa (quando há tempo pra isso! rsrs) e tomar sol olhando o céu. Gosto de falar besteiras com amigos e com a família e dar altas risadas. Gosto de assistir a filmes de madrugada, e ir dormir pensando neles. Gosto de andar a pé e sozinha quando não tenho nenhum compromisso, sem hora pra chegar. Gosto de olhar nos olhos dos outros, de cumprimentar pessoas, e de distribuir sorrisos e ser correspondida. Não é só. Mas paro por aqui, só por hoje. Ah, mais um pequeno prazer: escrever, mas só quando me dá vontade.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

E eu finjo ter paciência...






Já pararam pra pensar quantas coisas na vida nos exigem um esforço raro de paciência? Com o chefe chato no trabalho, com os problemas que insistem em crescer, com a espera incansável por um grande amor, a luta constante por um trabalho, um dia especial que demora de chegar, uma pessoa que está longe e que você morre de saudade... a vida é um exercício de paciência.
A música de Lenine traduz muito bem a angústia dos nossos dias e a procura imediata que temos por tudo. Queremos tudo, e queremos pra ontem. Às vezes eu mesma me pego assim, querendo entregar os pontos quando a ansiedade fala mais alto que a solução para os problemas. E quando pedimos conselho a um amigo, sempre escutamos a velha frase: "paciência, tudo vai dar certo". Mas nessa loucura de um "formidável mundo cão", como diria a música do Jay Vaquer, às vezes é impossível ir contra a esse sentimento de pressa. E digo isso porque o tempo todo lutamos contra o tempo, para dar conta de terminar um trabalho, para chegar pontualmente a um compromisso, para entregar um filme alugado... exigimos do mundo a solução para os nossos problemas com a mesma intensidade que ele exige de nós.
E voltando à música do Lenine, "Será que temos esse tempo pra perder, e quem quer saber: a vida é tão rara..." A única solução possível para o incansável exercício da paciência é ainda sermos surpreendidos pelas surpresas do que não esperamos, a alegria do encontro ao acaso, o papo legal em um ponto de ônibus com um desconhecido, a risada fora de hora, a espera por um longo abraço... deixemos a impaciência para tudo aquilo que não podemos intervir. Para todas as outras coisas, um pouco do acaso. Afinal, a vida é tão rara... e não pára, não.